Monday, February 06, 2006

Texto vazio


Está nas bancas a edição 1942 da revista Veja, prova física e inconteste de que governo-imprensa chegaram finalmente a um denominador comum de interesses e objetivos.

A revista e suas similares; Isto É e Época há poucos meses batiam furiosamente no governo federal num crescendo de denúncias a não deixar dúvida quanto ao firme propósito de impedir a reedição do governo petista.

Nada como dar tempo ao tempo. Mostrado seu poder de fogo, as empresas jornalísticas, talvez por remorso, substituem a munição real por balas de festim. Continuam a fazer barulho, mas atiradores e alvo sabem que sem consequencias funestas.

Eleição é número. Para cada exemplar vendido e efetivamente lido em seu conteúdo, centenas de olhos passam apenas pela capa, funcionando esta como panfleto gratuito e de grande penetração popular. As capas contundentes, de alguns meses, foram substituídas por material inócuo, pelo menos politicamente: um cidadão cavalgando uma bomba de gasolina, um cara-pintada islâmico, medicina alternativa, os efeitos dos videos-games sobre as crianças, etc.

Fachada nova, as equipes editoriais focam sua atenção para o material interno da revista. Não há como mudar de posição agora, tampouco como se omitir. A vida política nacional segue seu curso e o leitor reclama um posicionamente coerente de sua revista predileta, o que fazer?

Continuar batendo, é lógico, mas sem implicações eleitorais. Para conseguir este objetivo a competente equipe de Veja adotou uma estratégia dupla: transformou os assuntos objeto de crítica em peças de uma complexidade rocambolesca; relata encontros clandestinos ou secretos e a oferta de milhões para amigos destes ou daqueles, sem esclarecer, contudo, o se pretendia dos beneficiários dos pagamentos (o tom de denúncia faz acreditar que se tratava de algo ilícito).
A trama para afastar Daniel Dantas, do Opportunity, da luta pelo controle da Brasil Telecom é contada com a empolgação de uma história de James Bond, sem deixar claro quem era o mocinho ou o bandido da história.

A segunda estratégia é a denúncia oca e barulhenta de ilícitos tecnicamente inexistentes ou de intenções escusas que podem não ser mais do que o produto de ilações feitas na intimidade das editorias, como por exemplo as críticas a uma eventual candidatura do quase sexagenário Ministro Jobim como vice na futura chapa de Lula. É pouco provável, mas se a lei permite e as afinidades existem, não há porque a chapa não se concretizar. Agora, se as decisões de Jobim como ministro do STF, foram determinadas por interesses menores, cabe o questionamento do papel constitucional, estrutural e social da instituição Supremo Tribunal Federal, questão bem mais complexa do que a condenação de veleidades pessoais, como a praticada pelo texto da revista.

Noutra reportagem em tom de denúncia tomamos conhecimento que o empresário Naji Nahas recebeu da Telecon Itália 3,25 milhões de reais em espécie, a titulo de assessoria. Convenhamos, é um valor significativo, mas a Telecon Itália paga o que quiser a quem quiser, e se em algum momento o interesse público foi prejudicado pela interferencia do Sr.Naji Nahas, a reportagem não contou. E caso não descubra, não conte ou mesmo nada exista, a matéria terá sido informação vazia, a servir apenas na manutenção do tom denuncista adotado pela revista, sequer tirando votos do Sr.Naji Nahas que, até onde sabemos, não é candidato a nada.

Mais do que nunca, o material publicado pela revista funciona como uma pregação para convertidos. Aqueles que já antipatizavam com o governo continuam a comprá-la por sentirem que tem endosso às suas idéias, apenas reiteram sua posição, são votos que o governo já não teria.

Aqueles que simpatizam com o governo, não recebem pela leitura dos textos qualquer informação objetiva e conclusiva que os faça mudar de opinião.

O status-quo agradece.

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