Três horas da tarde numa quentíssima capital do nordeste brasileiro. O caminhante, com aquele jeito de remediado, está no ponto de ônibus, afinal caminhar é preciso, mas não a pé naquele calorão. Não dá para saber se poderia pagar um táxi. Com um visual casual-negligente, ocupava seu espaço na sombra do abrigo, vale-transporte na mão.
O dito vale-transporte dá direito à uma passagem nos ônibus comuns, frequentados pela plebe.
Para os encalorados que se dispõem a pagar mais 10 centavos, micro-ônibus com ar refrigerado aparecem a intervalos mais espaçados que os demais.
O caminhante mete a mão no bolso para pegar os centavos complementares, quando, repentinamente, surge um pedinte, espécie abundante naquelas horas quentes.
Um mendigo feíssimo, agreste e desprovido de qualquer humildade: ao mundo cabe dar o que ele precisa. e ponto final.
O mendigo estende a mão, já com várias moedas, ao caminhante:
-Me dá um troco para inteirar a passagem!
O caminhante olha para a moeda de 10 centavos no topo da pequena pilha na mão do pedinte e não se faz de rogado. Pede; voz baixa, confidencial:
-Eu estava precisando de 10 centavos...-Posso? Pergunta, estendendo a mão em pinça.
O pedinte viu o mundo virado às avessas. Estavam pedindo a ele! Vacila por um, talvez dois segundos, mas o orgulho fala mais alto. Desconfiado, pega a moeda e a dá ao caminhante, que simpático ainda confirma:
-Posso pegar? Sabe como é, nesses onibusinhos a gente tem que dar dez centavos a mais.
Nisso, o Mercedinho com ar-refrigerado encosta no ponto. O caminhante embarca feliz, passagem paga e complementada.
A porta se fecha e o motor ronca.
O pedinte fica olhando o ônibus se afastar no asfalto quente, rumo à praia. A dúvida se desvanece. Seu orgulho estava satisfeito.
Ele havia dado uma esmola.
No comments:
Post a Comment